Luz e escuridão

Rodrigo G. Gomes

Eu costumava acreditar que a vida era basicamente dor e sofrimento, não só dor e sofrimento, mas especialmente dor e sofrimento. Apesar de que, muitas vezes, parece realmente ser esse o caso: estamos constantemente com alguma preocupação, estamos sempre a tentar alcançar algo e nem sempre é fácil, estamos constantemente a ter de lidar com pessoas com quem não compactuamos ou de quem não gostamos… E existe sempre o lado poético da questão: dar à luz é doloroso. Amar é também sofrer, a dor é apenas sinal que nos importamos.

Mas acredito, agora, que a vida não é sofrimento, a vida não é nada senão uma questão de equilíbrio. E esse é um conceito no qual baseio a minha existência: o conceito do equilíbrio, o conceito do branco e do preto, a luz e a escuridão. Acredito que se nós nos limitamos a pensar que a vida é dor e sofrimento é porque nós temos tendência de manter o foco na dor e no sofrimento porque os efeitos parecem mais intensos e frequentes ou consistentes.

Temos tendência de ver os bons momentos da vida como algo que é garantido, é só o desconforto que nos influencia a mover ou a mudar alguma coisa. O conforto é somente confortável e nós, enquanto humanos, evitamos a dor a todo o custo. Temos a nossa característica e inerente ingratidão que nos previne de realmente desfrutar dos bons momentos que são tão frequentes (senão mais frequentes) do que os maus momentos. Ainda que pensar demasiado num bom momento possa acabar por estragar o momento precisamente por termos tendência de manter o foco numa potencial futura dor, o que só por si já causa dor num círculo fechado.

A vida não é só dor e sofrimento, a vida é equilibrada: preocupação revela que temos algo na nossa vida com que nos importamos verdadeiramente, o que significa que temos algo na nossa vida significativo o suficiente que está a causar essa preocupação. A preocupação em si é o preto, o que nos preocupa é o branco.

É difícil alcançar grandes conquistas na vida, mas assim que o conseguimos, sentimos a realização e tudo revela ter valido a pena. A jornada difícil é o preto, a conquista é o branco.

Nós temos, muitas vezes, de lidar com pessoas de quem não gostamos, mas também temos várias oportunidades para desfrutar da companhia de quem amamos. Ter de lidar com pessoas de quem não gostamos é o preto, a companhia de quem amamos é o branco.

Terminar um relacionamento com alguém, ou até só essa possibilidade, é sempre algo desagradável. Essa é a escuridão. A luz são todos os bons momentos que tivemos a oportunidade de partilhar com essa pessoa com quem, agora, por um motivo ou por outro, não vemos forma de continuar a nutrir uma relação. Talvez, simplesmente, por já não sermos compatíveis. Confesso que este é um ponto que me aterroriza.

Todo o amor do mundo é lindíssimo, mas o amor não existe sem o sofrimento que existe inerente nele. O amor é a luz, enquanto o desvanecimento desse amor é a escuridão. E ambos são igualmente necessários, um justifica o outro. O branco justifica o preto, e o preto justifica o branco. Sem o conceito de tristeza, o conceito de felicidade deixaria de ter sentido: a única razão para darmos valor a felicidade é precisamente por sabermos como é e o que é estarmos tristes. Sem um, o outro simplesmente não existe.

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